25.6.07

Rocky Balboa


O problema que um filme como Rocky Balboa enfrenta é básico: apresentar uma história que justifique esperar o filme inteiro quando tudo o que realmente importa é a hora da luta.
Isto é, por se tratar de um filme de Rocky, é evidente que haverá uma luta e que a mesma será ponto convergente de todo o filme. De cara o filme abre o jogo e apresenta o seu argumento.
Logo no início sabemos quem será o oponente de Rocky e a desculpa para que a luta aconteça. A partir daí é muito difícil evitar que o espectador pense "ok, vamos logo para a luta".
Mas realmente seria idiota se o Rocky fosse um personagem tão automático e clichê que sairia lutando sem mais nem menos depois de velho. Então o filme busca uma justificativa plausível para que Rocky aceite encarar um último desafio como boxeador. Nesta justificativa o filme quase se perde em monotonia. Quase. Construída com muito cuidado e delicadeza, a primeira parte do filme dá profundidade ao personagem de Stallone, mostrando sua vida social, familiar e amorosa, e os motivos pessoais que o levam a decidir lutar.
Em resumo, Rocky é meio perturbado com a morte da mulher, tem alguma raiva enrustida que ele precisa botar pra fora e, pra isso, nada melhor do que espancar alguém e ser idolatrado por isso. Então, uma luta viria a calhar. É um resumo mesmo, porque o filme apresenta isso de forma mais humana, abusando de um clima de solidão e tristeza, fazendo uma metáfora com o cãozinho do canil, um animal preso pronto para ser libertado.
Não dá para dizer que é um ótimo argumento. Mas temos que considerar que o filme não é um drama, e vendo por este lado, tem seu mérito por ter ousado extender e aprofundar-se neste aspecto bem mais do que o esperado. Creio que a medida foi ousada mas cuidadosa.
Depois disso, o filme muda, e dá aquilo que afinal todos esperam de Rocky Balboa. Não é para filosofar, chorar, pensar. É entretenimento, para encher os olhos. Uma experiência emocionante que constrói a expectativa e a adrenalina no público, que inevitavelmente vai torcer pelo Rocky e no clímax vai dar socos no ar como se lutasse junto.
Verdade seja dita, Rocky é isso, tem que ser isso, não pode ser outra coisa.
Então o dramalhão é deixado de lado e a expectativa começa a ser trabalhada. Para isso, nada melhor do que uma boa e nostálgica seqüência de treinamento: Rocky levantando pesos. Rocky correndo na neve. Rocky socando pedaços de carne no frigorífico! Mais clássico que isso, só aquela musiquinha filha da puta que, sem erro, bota qualquer um no clima: Gonna Fly Now.
O legal aqui é que o Rocky agora é tipo um Wolverine, um velhão duro na queda. Sem velocidade e com problemas nas juntas, Rocky treina força. Apenas força. A tática não podia ser mais tosca, nem mais satisfatória: não tem tática. Nada de esquivas ou truques técnicos. Apenas socos fortes, muito fortes, tijoladas. Para que cada uma que o oponente levar seja "como se ele tentasse beijar o trem expresso". :D
Pronto, depois disso, direto para o ringue, sem delongas. Um rápido beijinho na mulher da história só pra dizer ao público "sim, eles ficaram, mas não vamos perder tempo com isso".
A sequência da luta me surpreendeu. A edição ficou excelente. Bebe direto na fonte de Sin City, abusando do preto-e-branco com detalhes coloridos. As vezes o sangue vermelho, as vezes as partes amarelas do uniforme. Rocky cai, será que é o fim? ele vai levantar? Rocky fala consigo mesmo: "Get up! You can do it. Get up!" Em preto e branco, a cena é quase uma releitura do Hartigan de Sin City (Bruce Willis), resistindo com a corda no pescoço: "You can do it, old man. Stay Conscious".
O som, os cortes, os ângulos, as cores. Nota 10 para a edição de arte nessa parte do filme.
O final me deixou dividido, a princípio. Foi uma jogada arriscada. Criaram a nostalgia, a expectativa, elevaram a adrenalina, esbofetearam o público com cenas lindas, e deram um jeito de satisfazer a expectativa sem cair no clichê.
O clichê seria Rocky juntar forças e nocautear o oponente no finalzinho. Mas ele perde a luta e ao mesmo tempo sai com jeito de vencedor.
Tive que ver o filme duas vezes pra decidir o que pensar disso.
Na primeira vez, ficou aquela frustraçãozinha no fundo, de querer a vitória completa, afinal eu torci pelo Rocky, quem é que não torce? ainda mais com a musiquinha, getting strong now...
Mas a ficha caiu na segunda vez quando eu percebi a jogada. A segunda assistida é sempre mais analítica. O oponente da vez é o cara que nunca perdeu uma luta, e mesmo assim não tem o prestígio do público. Rocky, em contrapartida, é o herói do povo, ele perde, mas ganha a torcida. "Não é o quanto se bate, mas o quanto se consegue suportar e seguir em frente". O argumento fechou.
Está longe de ser um grande clássico, mas considerando as limitações intrínsecas de roteiro para um filme desses, o resultado ficou excelente, o velho clichê deixou de ser tão óbvio e gratuito e ainda ganhou (um pouco de) conteúdo e estética. É um desfecho de respeito para a saga de Stallone como Rocky Balboa.

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